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domingo, 3 de junho de 2012

Crônicas de Ontem 3



O ônibus seguia curso até o terminal. Eu acompanhava as letras miúdas da velhinha. Provérbios. Só me dei conta de que ele estava ali quando a ladainha ficou alta.


- No meu tempo, moleque tinha mais respeito por idoso.


Achei que era comigo, mas depois pensei que não tinha nada a ver. Voltei a olhar as letras do livreto.


- Mas é muita falta de educação, hein?


Não tive como não perceber, já que ele me olhava explicitamente. Então, virei o rosto rápido, num insight. Ali estava ela, a tarja amarela no encosto: banco de velho. Respirei fundo e me esgueirei pra fora, no espacinho que ele fez questão de me dar.


- Foi mal, não vi. Não percebi que o banco...


- Sei. Por favor, me deixe em paz. Era só o que faltava.


Engoli em seco, afastei alguns passos e tentei me concentrar na paisagem da janela. Então, ouvi quando ele disse.


- É um absurdo, essa gente. Você tem que lutar pra conseguir o que é seu por direito. Absurdo.


Não deu pra me conter.


- Ei, eu não tinha visto que o banco era de idoso. Se o senhor tivesse me falado, com educação, eu tinha feito o mesmo que fiz, dado o lugar.


- Não estou falando com você! Não me dirija a palavra, está entendendo? Eu não lhe dou essa intimidade.


- Toma vergonha na sua cara, seu velho mal humorado. Sem educação.


O homem inchou, o rosto estava coberto de ódio, mas não precisou se levantar, porque o clone do Jorge Vercilo no corpo do Giba, que estava sentado em sua frente, tomou suas dores. Levantou e veio em minha direção. Só uma chance me ocorria naquela hora: piso no joelho e entro com um direto. Com alguma sorte, os golpes seriam consecutivos e ele ia dormir cedo o sono dos putos.






- Tu tem que aprender a respeitar os mais velhos, guri. - ele disse, cheio de convicção, com um orgulho enorme por defender a honra do velho babaca. Foi então, que a voz do homem de idade novamente se fez ouvir.


- Motorista, faça alguma coisa. Os negros vão brigar aqui. Que absurdo.


Foi um comentário rápido, daqueles que alguns até ignoram, mas não Jorge Vergiba. O cara parou, de repente, mais branco do que era, totalmente emputecido embaixo do cabelo crespo. Seu corpo se virou lentamente na direção do idoso, enquanto eu podia ver o que estava prestes a acontecer.

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