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quinta-feira, 29 de abril de 2010

conserto em dó maior

vai, dance uma valsa lunar
espalhe estrelas no vasto
flauta argentina de boca
entoando cantos do vento
repentindo o movimento dos astros
anéis em plena posse

teu corpo se dobra
badalos transmitem urgências
múltiplas vértebras percebo
nos teus hemisférios
e me contento com o que vejo
mastigando pensamentos

teu vestido de flor
em nada tem a ver contigo
por isso não te veste dele
some por uma das casas e esquece
deixa o cabelo preso feito tiara
um sorriso guardando a entrada

"não me reconhece?"
mas sou eu quem desconheço
e toda aquela primeira vez
acontece novamente como antes
em um instante estou de novo
diante do maior de todos

repouso no teu espaço
teu lábio quase me roça o pescoço
quando o grito se fez alto
e tuas vinhas, fugindo à luz,
procuraram abrigo no interior
do meu espírito encarnado

agora descanso na morte
primeira a que temos direito
quando o espírito quase livre
pinta lugares inteiros com a pura tinta
dos seus devaneios mais profundos
coisas que não se ensina

minha tela é um coração
de muitas artérias e veias
aqui, as poucas cores que tenho à paleta:
azul dos tempos de infância
um bocado de vermelho pra garantir
uma mancha amarelo manga

vai, esqueça de vez o salão
dê os teus passos nas nuvens
em direção aos primeiros raios do mundo
onde amores sucedem infortúnios
até se tornarem por si mesmos um fardo
que só teu gesto desfaz em pedaços


Um comentário:

Flávio Morgado disse...

Belíssimo poema, amigo Antônio.
Um poema com a dosagem na justa medida pra se ler com gosto e saber reconhecer um talento: uma métrica condensada e incisiva e um tema que aborda um certo existencialismo, sem pesar as duras teorias.
Realmente admirável.
Faço-me um seguidor.

Flávio Morgado.